Com o escritor e dramaturgo Marcelino Freire. e a participação especial do psicólogo e criador do podcast “A Loucura Nossa de Cada Dia”, Guilherme Facci é o nosso convidado no “Lugares Comuns”,

Encerramos a série “Masculinidades Brasileiras” revisitando muitos dos temas que tratamos ao longo de 4 temporadas neste seu espaço de resistência afetiva na podosfera, a partir da visão do nosso convidado do 7º episódio, o escritor e dramaturgo Marcelino Freire (@marcelino_freire_escritor).

Pra que você que ouviu os 2 episódios anteriores, que estão imperdíveis, já sabe que resgatamos essas 3 pérolas do nosso arquivo, gravadas em 2020, com 3 convidados que já passaram pelo almasculina para esta série especial!

O psicólogo e criador do podcast “A Loucura Nossa de Cada Dia”, Guilherme Facci (@guilherme.facci), é o nosso convidado no “Lugares Comuns”, quadro que dá voz a especialistas, gente que pesquisa e entende muito do assunto, explicando termos, conceitos e ampliando a nossa visão sobre tópicos mais específicos.

E desde já agradecemos a todos os nossos apoiadores, em especial: Alexandre Valverde, Ana Maria de Lima Rodrigues, Danilo Azevedo, Felipe Rocha e Juliana Dias.

– Ouça aqui o episódio na íntegra:

– Assista à gravação na íntegra no nosso canal no Youtube!

LUGARES COMUNS com o psicólogo e criador do podcast “A Loucura Nossa de Cada Dia”, Guilherme Facci (@guilherme.facci), sobre “Masculinidades e contexto político”:

PAULO AZEVEDO: “No episódio #60 que abriu essa temporada com o escritor Alexandre Coimbra Amaral, a gente falou um pouco o quanto que a gente tem buscado escapar dessa dura realidade nos nossos tempos, em especial nesse contexto político devastador no Brasil, e também dessa dificuldade de se colocar em atrito, que toda e qualquer relação pressupõe, o que que nesse contexto, como é que fica o lugar do prazer e das masculinidades, que muitas vezes buscam em vícios como as redes sociais, alcoolismo, pornografia, as drogas, uma válvula de escape, né? A gente está num contexto tão árido, que ao mesmo tempo que a gente vai buscar nas relações um ponto de apoio, mas também está tão escapista, superficial, difícil encontrar momento sem que você consegue se aprofundar e, realmente se colocar diante do outro por inteiro, em troca, em intercâmbio, em estabelecimento de conexões um pouco mais para além do assunto, da pauta do dia. E aí eu também queria saber um assunto que a Vera Iaconelli já abordou no podcast dela, porque o prazer é muitas vezes tratado com moralismo, pelas famílias e pelo Estado.”

GUILHERME FACCI: “A tradição judaico-cristã ajuda bastante, ou ajudou bastante, não sempre foi, mas se existe algum moralismo, o prazer é muito proibido, por exemplo, o texto do Freud, “O Mal-Estar na Civilização”, fala sobre isso também, ele sacou isso em 1930, existe uma proibição, sim, nós neuróticos nos proibimos de maneira muito eficiente, a via do desejo, se autorizar a ter algum prazer e isso se agrava, Paulo, talvez num momento aonde a divisão tão binária, o imaginário esteja tão consistente, porque o imaginário consistente é sinônimo de troca.”

PAULO AZEVEDO: “O que seria esse imaginário consistente?”

GUILHERME FACCI: “O imaginário consistente é quando o outro não existe. O outro não existe, o que existe são relações espelhadas, vamos dizer assim, eu me relaciono com o meu reflexo no espelho a partir absolutamente tomado pelo meu imaginário. O problema do imaginário absoluto é que ele se divide num binarismo que é mais ou menos assim, matar ou morrer, a sua existência, se é que ela acontece em algum momento, ela deve ser aniquilada, porque me ameaça, a sua existência me ameaça, a sua crença ameaça a minha verdade. E eu devo defender a minha verdade mesmo que eu tenha que te matar, não é isso que estamos vendo o Putin fazer agora? É alguém que tem uma profunda crença e a minha crença deve aniquilar a sua. Porque a sua me lembra do meu desejo e aí é um problema, a base da homofobia não é essa, gente? O homofóbico é aquele que deseja outro homem e condena o desejo do outro. Olha que covardia, neurótico também é um covarde, em muitos aspectos a análise pode ajudar, não acredito que a análise tem vários métodos, várias formas de psicoterapias, mas talvez a psicanálise, pelo pouco que ela pode fazer no mundo ela pode ajude um pouquinho aí a fraturar nosso imaginário, acho que é uma grande travessia analítica sair de uma posição completamente idiota no começo de análise, ou dito de outra maneira, toda fálica, para um lado não todo idiota, que é não todo fálico, uh! Anos e anos e não é pouca coisa, gente! Deixar de ser um idiota completo ou uma idiota, nossa! Pode ser uma grande passagem.”

PAULO AZEVEDO: “Mas quanto mais cedo, melhor, né? Porque aí você fica menos tempo de vida idiota…”

GUILHERME FACCI: “Ah, sim, para a própria pessoa, quer dizer é bom para quem está em volta, mas do ponto de vista do prazer, que foi a pergunta, você só extrai um prazer autêntico, pela saída feminina, a saída pelo feminino, que é a saída não toda fálica ou não toda idiota, Lacan nomeava assim, eu prefiro uma posição lógica, que a gente tire o gênero, feminino serve para homem e para a mulher, então, qualquer estilo de sexuação, falo não é pinto, falo é um indexador da diferença, só isso. Só isso, não, isso tudo.”

PAULO AZEVEDO: “Isso de quando você fala ir pela via do feminino, para mim quando eu leio e escuto isso, tem a ver assim, menos utilitária e pragmática da ação, por exemplo quando fala o prazer não tem um objetivo final, como trabalho, trabalho este mês para receber, trabalho este mês para fazer uma carreira, trabalho para produzir algo de sentido no mundo. Mas as drogas, o álcool, o açúcar, as redes sociais, porque tem uma coisa, quando a gente fala de vício, o que Estado também entende como vício, ele escolhe o que ele entende como droga. A gente esquece que as farmácias estão aí, a gente esquece que os bares com cigarros, bebida alcoólica autorizada está aí, as redes sociais nas mãos de crianças estão aí, com todo tipo de conteúdo. Então, o que que é vício, porque tem uma questão moralista muito grande, e uma ideia de controle e combate desse lugar do prazer. Cuidado, não entre tanto por aí porque você não sabe onde vai dar, mesmo nas abordagens de masculinidades, às vezes, eu vejo, Guilherme, tratando que o problema é a pornografia como vício, sendo que o que tem por trás dessa produção audiovisual imagética, questões políticas muito mais graves do que o próprio vício daquele que consome.”

GUILHERME FACCI: “Sim, onde tem gozo tem pouca possibilidade de uso de prazer, porque independe da substância, eu queria tirar um pouco a substância, o objeto, o objeto pornografia, o objeto álcool, objeto droga, o objeto rede social, é como a gente vai se relacionar com isso. Esse objeto muito colado, o excesso, a proximidade, impede o desejo, que é a via do prazer, para ter prazer, para ter desejo, quase um sinônimo, desejo é castração, desejo é um limite colocado no campo do gozo que é aquilo que está em excesso para que possa ser extraído um prazer, porque esse ficar 48horas vendo pornografia ou se drogando, você não está tendo prazer.”

PAULO AZEVEDO: “Por que não, Guilherme, traduz aí para o pessoal de casa.”

GUILHERME FACCI: “Porque é uma tentativa de ter, tentativa de dar conta da angústia, tamponar a angústia usando droga sem parar, ou fumando um cigarro atrás do outro, ou transando com pessoas em série, é a tentativa de tamponar, de dar conta da angústia, só que essa tentativa no final das contas, causa mais angústia. Não vai dar conta, a gente acha que apreendendo objeto, você vai se apoderar, vai encontrar o objeto e aquilo vai satisfazer absolutamente. E essa operação vai nos revelar que o objeto não pode ser apreendido, ele pode ser contornado. Isso significa que existe prazer parcial, mas não existe o encontro absoluto com o objeto. Talvez exista na melancolia, mas é um outro problema, acho que é um outro podcast para falar sobre isso, na neurose, não, o encontro é sempre parcial, não tem encontro.”

PAULO AZEVEDO: “Quase que escapa.”

GUILHERME FACCI: “Escapa, tem que escapar para estar se sustentando como desejo não como gozo, o gozo é quando objeto está muito próximo e a gente quase se fusiona, é uma tentativa de encontro infinito que não acontece, mas que causa sofrimento.”

LUGARES COMUNS com o psicólogo e criador do podcast “A Loucura Nossa de Cada Dia”, Guilherme Facci (@guilherme.facci), sobre “Prazer, vícios e masculinidades”:

PAULO AZEVEDO: “Desde o início dessa temporada a gente tem procurado ficar bem atento pelo fato de ser um ano eleitoral que para a gente e para quem está um pouco consciente da realidade, é um ano fatídico, extremamente importante que vai definir quanto tempo a gente vai levar para reconstruir o Brasil. Se vão ser anos, décadas ou …quantos anos a gente vai precisar para reconstruir Meio ambiente, Educação Cultura e tudo mais para um país que voltou para a linha da pobreza, que é recorde mundial em desemprego e por aí vai. E no seu podcast” A loucura nossa de cada dia” tem um episódio sobre esperança, medo e expectativas que eu adorei esse episódio, eu queria saber como você percebe que as masculinidades lidam com esses sentimentos nesse contexto político, hoje, no Brasil e porque esse assunto que deveria ser tratado como algo que faz parte, a política provoca tanto os nossos afetos e entra no pacote: não se fala sobre religião, futebol e política?”

GUILHERME FACCI: “Você percebe como a gente começa a polarizar não no sentido de dar consistência coletiva a algumas posições, aí não tem condição é Deus acima de tudo. Se é Deus acima de tudo, acabou. É o fim, esse é um problemaço.”

PAULO AZEVEDO: “De qual Deus estamos falando, para início de conversa.”

GUILHERME FACCI: “De qual Deus, porque que Deus é homem, tem papa mulher, porque que não tem?”

PAULO AZEVEDO: “Estado laico, vão embora, né?”

GUILHERME FACCI: “Mas se é Deus acima de tudo, acabou. Acabou. Nesse sentido você começa a perder a esperança, a esperança não no sentido de uma expectativa não muito idealizada, eu sou cético nesse sentido, eu acho que a gente quase voltou pra idade média e vai demorar muito pra avançar, não sei se eu vou estar aqui, não sei se a próxima geração vai estar. Não sou muito otimista nesse sentido, mas estamos aqui, agora, o que a gente pode fazer?”

PAULO AZEVEDO: “O que que a gente pode fazer, Guilherme?”

GUILHERME FACCI: “Parte a gente já está fazendo, a gente está conversando a gente está expondo a nossa conversa, a gente está compartilhando algo do que a gente está elaborando aqui e agora. Então, elaborar, simbolizar, redirecionar, endereçar respostas, isso não é pouca coisa, gente, isso tem efeitos na realidade, não é pouca coisa. Escutar, escutar o outro de maneira autêntica, na sua angústia, de maneira plena, íntegra, escutar não é ficar esperando para dar resposta ao que o outro está falando, poder acolher o outro, isso é possível. E isso tem efeitos na realidade, quando e de que forma isso vai acontecer, eu não sei.”

PAULO AZEVEDO: “E qual sintoma que você percebe nesse contexto tão polarizado, que a política gera tantos afetos e tantas reações que a gente não e cansa de surpreender com bizarrices cotidianas.”

GUILHERME FACCI: “A gente tenta recalcar em nós mesmos e jogar no outro, então, né é difícil, seria tão bom se nas escolas, na universidade a gente tivesse mais filosofia, mais psicologia, mais psicanálise, antropologia, isso devia fazer parte do ensino primário, gente. Nada contra química, (risos) mas a capacidade de exercitar e exercer o pensamento crítico, acho que isso está faltando, está fora. E, a partir do momento que isso está for ade uma sociedade, como que a gente muda, como que a gente faz alguma coisa, se eu estou na minha própria consistência, no meu próprio imaginário e tomando o outro como uma ameaça, que deve ser anulado, cancelado ou morto.”

almasculina é feito por:

Idealização, roteiro, edição e apresentação: Paulo Azevedo (@pauloazevedooficial).

Trilha sonora original e mixagem: Conrado Goys (@conza01).

Fotos e arte: Vitor Vieira (@vitorvieirafotografia).

Colaboração: Glaura Santos (@glaurasantos) e Soraia Azevedo (@alvesdeazevedosoraia).

Realização: Comcultura (www.comcultura.com.br).

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